A fauna do Parque Nacional da Gorongosa (PNG) está “em franca recuperação”, segundo o diretor da principal área protegida moçambicana, que conta agora com quatro mil espécies, algumas novas para a ciência.
“Temos uma franca recuperação dos efetivos e as pessoas que nos visitam com regularidade já conseguem ver a diferença entre um safari agora comparado com há cinco anos”, disse em entrevista à Lusa Mateus Mutemba, uma das cinco personalidades do PNG condecoradas na terça-feira pelo Estado português.
Após o fim da guerra civil em Moçambique, em 1992, estima-se que 90% da fauna no PNG tenha sido dizimada e, em 2005, o Governo moçambicano assinou com a fundação do filantropo norte-americano Gregory Carr uma parceria por vinte anos com vista à recuperação da área protegida.
Segundo Mateus Mutemba, a população de elefantes registava menos de cem no pós-guerra está agora estimada em mais de 500, os búfalos, que chegaram a ser 14 mil em 1972, caíram para 60 em 2000 e são agora mais de 600, tornando-se “muito frequente vê-los nas planícies da Gorongosa em manadas de cem indivíduos”.
A população de pivas subiu de 3.500 para 35 mil e a Gorongosa acolhe a maior população desta espécie de grande antílope em África. Os pala-pala são agora 800 e as próprias impalas sofreram “uma recuperação visível” e já abundam no parque.
“Fizemos também a reintrodução de elandes, búfalos, bois-cavalos, alguns hipopótamos e elefantes, para ter melhoramento genético, e registamos com satisfação que, associadas ao ritmo de recuperação natural de algumas espécies, já contribuem para que haja mais diversidade”, referiu o diretor do parque.
Salientando que o PNG nunca tinha sido muito estudado, Mateus Mutemba disse que três levantamentos de biodiversidade foram realizados desde o início do projeto de restauro e que identificaram cerca de quatro mil espécies, algumas das quais inéditas.
“A informação ainda está a ser processada, mas há a indicação de haver espécies que são novas para a ciência e outras que são novas na Gorongosa”, observou.
O diretor do PNG prevê que os projetos de reintrodução de espécies continuem a assentar nos grandes herbívoros, como o búfalo e também a zebra, “não só pelo seu papel no ecossistema mas também por ser belo e acrescentar valor à oferta do parque”, mantendo o rinoceronte, para já, fora dos planos.
“Admitimos rinoceronte mas a longo-prazo”, avançou, justificando esta opção com a prioridade dada a outros herbívoros e também com a caça furtiva.
“Sabemos que o rinoceronte é objeto de uma procura incrível e não queremos trazê-lo quando não estamos devidamente preparados contra esses sindicatos de caça”, explicou.
A caça furtiva na Gorongosa, segundo Mutemba, tem caraterísticas diferentes do Parque Nacional do Limpopo ou da Reserva do Niassa, “onde ocorrem autênticos massacres”, sobretudo dirigidos aos elefantes.
“No PNG, o objeto da caça é mais orientado para os animais que são fonte de carne, sobretudo antílopes”, indicou o diretor, referindo armadilhas colocadas de forma indiscriminada acabam por atingir outras espécies, incluindo a mais emblemática, o leão.
Da população estimada de 68 leões no PNG, pelo menos oito foram apanhados em armadilhas, dos quais seis foram recuperados e dois foram perdidos.
Calcula-se que entre 5.000 e 6.000 animais tenham sido abatidos em três anos pela caça furtiva no PNG, mas o diretor da área protegida acredita que, com as ações em curso, os números sejam já mais baixos.
Com uma forte componente científica, um laboratório de referência e a presença constante de investigadores de todo o mundo, o PNG aposta nessa diferenciação face à elevada oferta de turismo em áreas de conservação nos vizinhos Zimbabué, Tanzânia e África do Sul.
“Só o facto de estarmos num projeto de restauro já torna mais apelativa a Gorongosa”, frisa Mateus Mutemba, valorizando ainda “a beleza cénica espetacular, de tirar o fôlego” e a oportunidade de interagir com o conhecimento científico, os próprios investigadores e ainda as comunidades locais.